Dizem que os românticos são aqueles que só gostam de coisas muito belas
E apenas mui belas, nada menos que arrebatadoras
Como Grace Kelly, sublime em um Dior de chiffon ou tafetá de seda azul,
Silvana Mangano, em Morte em Veneza, aristocrática,
Com véu de tule bordado em renaissance,
Alain Delon, oh! Alain Delon, como Rocco, o ingênuo e puro,
Lindíssimo Rocco, em Rocco e seus irmãos.
Românticos, lembrem-se de que, na vida real,
Também os belos buscam somente outros belos,
Também os belos gostam apenas de belos.
Os menos belos apaixonam-se pelos mais belos, Pasolini.
E, se não és belo, é certo que sofrerás,
Debalde beijarás mãos, arrastar-te-ás aos pés.
Se não tiveres controle sobre teus sentimentos românticos,
Passarás pela sarjeta, tomarás goles e goles de cachaça ou vermute,
Tudo inutilmente, se não fores belo também.
Tu me prendeste sem nenhuma corrente, me seguras sem usar teus braços
Ou mãos, quem me defenderá de tua beleza? Michelangelo.
Ninguém ouvirá teus soluços nem acompanhará teus passos
Quando na madrugada, bêbado, atravessares a praça, trôpego,
Com imensa vontade de chorar.
Nenhum ídolo ou anjo lindo, trajando Armani, forte, esbelto, de belas coxas
Colocará os braços quentes sobre teu pescoço
Ou os lábios cálidos sobre os teus lábios frios quando amanheceres em um banco de praça
Enregelado, louco de paixão e desejo, rejeitado por um belo semideus qualquer.
A tal ponto poderás chegar.
Procura sim, antes, um buteco humilde, com gente simples, comum, como tu.
Certamente logo aparecerá um homem, não exatamente belo, mas másculo, ou uma mulher,
Também não especialmente bela nem diva esplêndida, mas delicada, amistosa,
Que te acolherá.
Te fará companhia.
Conversará sobre coisas tolas, simples, divertidas.
Com quem passarás a noite e observarás estrelas cadentes.
Com quem terás repouso sem desprezo e humilhações.