Prefácio / Foreword

Bati de frente com uma montanha.

Essa montanha é a poesia e a filosofia chinesas.

Pensei em escrever uma breve resenha da poesia chinesa, dentro do Livro Português. Seria um modesto carinho a Macau, esse pequenino porto que já foi transitoriamente administrado por portugueses.

Macau representou uma gentileza da gigante China para Portugal. Funcionou por uns tempos, agora já findos. Para muitas pessoas, tempos felizes e saudosos.

Tempos felizes em que os falantes da língua portuguesa estavam grudados no gigante cultural, rochedo milenar altivo, com sua permissão, conhecendo sua história e se alimentando de sua magnífica sabedoria.

Quando conheci melhor o monumento da poesia chinesa, recuei. Porque é tão colossal que pode ser fonte de estudos de toda uma vida. Como fazer uma resenha de um material que consumirá a vida toda para ser apenas superficialmente conhecido?

Entretanto fiz um esboço, para reverenciar Macau, humildemente. Não uma resenha, lógico, mas uma pequena homenagem ao mundo de beleza e exotismo que essa terra do Oriente nos ofereceu. Assim como Goa e outros portos indianos representaram uma chance de acesso do mundo lusófono ao encantado mundo da Índia, Macau permitiu-nos esse acesso ao sábio mundo da China, um relicário de emoções e de humanidade.

Não coube no Livro Português. Então será um livreto à parte.

Como também não sei decifrar nem mesmo um ideograma sequer, tive de me aproximar dos processos de “reimaginação” dos concretistas brasileiros e imitar a astúcia poética de Ezra Pound. Meu método está explicado no texto lírico 3.

Minha gratidão aos corajosos e esforçados tradutores do chinês para línguas ocidentais, a cujas traduções consegui ter acesso pelo menos parcialmente e me permitiram ter uma ideia da poesia e filosofia chinesas. Especialmente o jesuíta português Joaquim A. de Jesus Guerra. Também Giorgio Sinedino, Yu Ping Fang, Ricardo Primo Portugal, Tan Xiao, António Graça de Abreu, Sérgio Caparelli, Sun Yuqi, Gil de Carvalho,Camilo Pessanha,  Evandro Nóbrega, Joaquín Perez Arroyo, Witter Bynner, Wu-Chi Liu, Irving Yucheng Lo, Huang Xinqu, Carmelo Elorduy, James Legge, David Hinton, David Hawkes, Arthur Waley, Burton Watson, Kenneth Rexroth,  Anne Birrel, Herbert Allen Giles, Tony Barnstone, Chou Ping, Luis Enrique Délano, Raúl A. Ruy, Patricia Guillermaz, Georges Margouliès, Claude Roy, D. C. Lau, Franz Toussaint, Octavio Paz, Ian Johnston, Ye Chun, Francesco De Luca, Jerome Ch’ên, às Edições em Línguas Estrangeiras do governo da República Popular da China. E também o Ezra Pound de Cathay, as “reimaginações” de Haroldo de Campos, as versões a partir de traduções inglesas e francesas de Cecília Meireles, as versões a partir da língua francesa de António Feijó. Por último, mas muito importante, as traduções automáticas a partir do Baidu.

Ernest Fenollosa, em seu famoso The chinese written character as a medium for poetry, editado por Ezra Pound, critica a tradução de poesia chinesa por filólogos ocidentais, os chamados sinólogos. Ele diz: Talvez fosse esperar demais que estudiosos já idosos, que passaram a juventude se digladiando com os complicados ideogramas chineses, tivessem sucesso também como poetas. 

Parece que ele quer dizer que os poetas sabem manejar o arco lírico, mas não compreendem os caracteres chineses. Os filólogos, sinólogos, pelo contrário, compreendem os ideogramas, mas não sabem traduzi-los com lirismo. Seria isso?

A minha opinião sobre os filólogos, inclusive os sinólogos, foi expressa no poema “Filólogos”, no livro Posta Restante.

Não desejo discutir esses assuntos. Eu só quero prestar um singelo tributo a Macau, pedir desculpas por alguma coisa e agradecer por tudo.

 

Foreword:

I bumped into a mountain.

That mountain is Chinese poetry and philosophy.

I thought of writing a brief review of Chinese poetry, within the Portuguese Book. It would be a modest caress for Macao, this tiny port that was once temporarily administered by the Portuguese.

Macao represented a kindness from giant China to Portugal. It worked for a while, now over. For many people, happy and nostalgic times.

Happy times when the Portuguese-speaking people were glued to the cultural giant, a towering millennial rock, with their permission, learning about its history and feeding off its magnificent wisdom.

When I got to know the monument of Chinese poetry better, I stepped back. Because it is so colossal that it can be a source of studies of a lifetime. How can I review material that will consume a lifetime to be only superficially known?

However, I made a sketch, to revere Macao, humbly. Not a review, of course, but a small tribute to the world of beauty and exoticism that this land of the Orient has offered us. Just as Goa and other Indian ports represented a chance for the Portuguese-speaking world to access the enchanted world of India, Macao gave us access to the wise world of China, a reliquary of emotions and humanity.

It was very big and did not fit in the Portuguese book. So it will be a separate booklet.

Since I also cannot decipher even one ideogram, I had to approach the “reimagining” processes of the Brazilian concretists and imitate the poetic astuteness of Ezra Pound. My method is explained in lyric text 3.

My gratitude to the brave and hardworking translators of Chinese into Western languages, to whose translations I was able to have access at least partially and allowed me to get an idea of Chinese poetry and philosophy. Especially the Portuguese Jesuit Joaquim A. de Jesus Guerra. Also Giorgio Sinedino, Yu Ping Fang, Ricardo Primo Portugal, Tan Xiao, António Graça de Abreu, Sérgio Caparelli, Sun Yuqi, Gil de Carvalho, Camilo Pessanha, Evandro Nóbrega, Joaquín Perez Arroyo, Witter Bynner, Wu-Chi Liu, Irving Yucheng Lo, Huang Xinqu, Carmelo Elorduy, James Legge, David Hinton, Arthur Waley, Burton Watson, Kenneth Rexroth, Anne Birrel, Herbert Allen Giles, Tony Barnstone, Chou Ping, Luis Enrique Délano, Raúl A. Ruy, Patricia Guillermaz, Georges Margouliès, Claude Roy, D. C. Lau, Franz Toussaint, Octavio Paz, Ian Johnston, Ye Chun, Francesco De Luca, Jerome Ch’ên, to the Foreign Language Editions of the Government of the People’s Republic of China. And also Cathay’s Ezra Pound, Haroldo de Campos’ “reimaginings,” Cecília Meireles’ versions from English and French translations, Antonio Feijo’s versions from the French language.  Last, but very important, the automatic translations from Baidu.

Ernest Fenollosa, in his famous The Chinese written character as a medium for poetry, edited by Ezra Pound, criticizes the translation of Chinese poetry by Western philologists, the so-called sinologists. He says: It was perhaps too much to expect that aged scholars who had spent their youth in gladiatorial combats with the refractory Chinese characters should succeed also as poets. 

It seems that he means that poets know how to handle the lyrical arc, but do not understand Chinese characters. Philologists, sinologists, on the other hand, understand the ideograms, but do not know how to translate them lyrically. Is that it?

My opinion about philologists, including sinologists, was expressed in my poem “Philologists”, in the book Posta Restante.

I do not wish to discuss these matters. I just want to pay a simple tribute to Macao, apologize for something and give thanks for everything.

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