Prefácio do Livro Português

 

Este livro faz parte de um conjunto de nove livros que estão sendo escritos pelo Autor e que podem ser lidos em parte no site josegomespoesia.com, também chamado de “Pequenos Textos Líricos”.

Os nove livros são: O Livro Brasileiro, O Livro Português, Uma Resenha de “O Mahabharata”, O Livro Negro, O Livro Alemão, Uma Resenha da Poesia Chinesa, O Livro Latino, O Livro Grego e o livro Posta Restante.

O Autor é um velho que nasceu no Piauí, numa pequena cidade chamada Uruçuí, mas viveu lá apenas um ano. Seus pais o levaram para viver numa pequena vila do Maranhão até os cinco anos, depois, de volta ao Piauí, foi deixado na casa dos avós maternos por um ano e meio, num maravilhoso sítio no município de Ribeiro Gonçalves cheio de água, pântanos e brejos, cacimbas, buritizais, frutas, jumentos, extensos canaviais, engenho de moer cana para fazer rapadura e cachaça, tudo bem próximo do tranquilo Rio Parnaíba. Com sete anos foi trazido para o antigo Norte de Goiás, onde hoje é Tocantins, e viveu em uma pequena cidade de nome Aliança do Norte. Concluiu o ginásio em Gurupi. Em seguida foi para Goiânia, onde fez o colegial e a graduação em Medicina na Universidade Federal. Após isso morou na muito agradável cidade de Belo Horizonte, onde fez especialização em Oftalmologia. Ao findar o curso, após três anos, trabalhou alguns meses no Pará, em Conceição do Araguaia. Daí foi trabalhar em Rondônia, quando a cidade de Rolim de Moura estava iniciando. Em seguida morou um ano e meio em Münster, Alemanha, onde frequentou aulas de latim, grego e filosofia na Universidade. O Autor gostou muito desses estudos em Münster, mas não conseguiu continuar porque não suportou exercer por mais tempo a honrada mas duríssima profissão de faxineiro, que era sua fonte de subsistência. Ao retornar permaneceu por dez anos na cidade de São Paulo, lugar de muitas solidões no meio da multidão.  Concluiu a especialização em Medicina do Trabalho na Universidade de São Paulo. Também nessa universidade iniciou, sem concluir, cursos de Direito e Letras. Em São Paulo entrou no serviço público federal e, em 1999, a pedido, para ficar mais perto de sua família e amigos em Goiânia, foi transferido para Brasília, onde também montou um pequeno consultório popular de oftalmologia na periferia. Nesta cidade está há mais de vinte anos e dela só sairá para a viagem final.

Com tantas idas e vindas o Autor pode confirmar a opinião dos filósofos e escritores: por todos os lugares o sofrimento humano é o mesmo. Alguns fingem ser muito felizes, bem-sucedidos, vitoriosos. Muitos se sentem amados, bem-casados, seguros. Pode ser que existam sortudos. Entretanto, quase todos nós somos apenas peregrinos, solitários, indecisos, empurrados, curiosos, que não sabem como a viagem acabará.

O Autor tem uma certa pena da humanidade e do mundo. Não deveria, porque é humilhante para alguém ser objeto de piedade, mas o Autor não consegue refrear a pena que tem dos seus semelhantes e de si mesmo. Pena do sofrimento dos animais também. Não simpatiza com pessoas narcísicas, que se acham melhores que os outros, que estão sempre orgulhosos de suas realizações geniais, olhando para suas pobres emoções e necessidades. O Autor tem muito medo de se tornar narcísico, porque acredita que o narcisismo é uma doença contagiosa que afeta boa parte da humanidade.

O Autor não mostrará sua velhice. Você não verá fotos do Autor já velho. Verá apenas as fotos dele na juventude, ingênuo, idiota, ainda cheio de esperanças. Não confunda isso com narcisismo.

Ao escrever, o Autor quer emocionar e convencer. Por isso, diariamente, tenta incorporar o Daimon do Ion, de Platão, seguir as regras da Poética de Aristóteles, usar muitas palavras gentis como recomenda Horácio e fazer muitos elogios e encômios como Píndaro, para alevantar a alma dos que estão tristes e desalentados.

O Autor acredita que toda língua deve ter a sua gramática culta, que deve ser aprendida, preservada e usada nas relações formais.

Mas acredita também que toda língua tem a sua vivacidade popular, seus usos fora do padrão culto que fazem o tempero da literatura ficcional, prosa ou poesia, porque representam a genuína alma dos falantes, suas emoções e experiências triviais e as pulsações da língua viva. Portanto, o Autor espera que não se exijam nesses escritos a contínua adequação à norma culta.

 

O Autor usa o “tu” e o “você” indiferentemente em seus textos, levando em conta apenas a questão estética e os mistura no mesmo texto sem muita cerimônia. Espera que nessa altura ninguém mais se escandalize com isso também. Assim também com o uso não ortodoxo de ênclise ou próclise de pronomes.

A acentuação não segue fielmente os padrões dos acordos ortográficos para evitar que as pessoas de São Paulo falem tudo fechado, como tem sido a tendência recentemente. Os brasileiros de São Paulo, e consequentemente a elite, os locutores dos meios de comunicação, os cantores, resolveram que a metafonia da língua portuguesa (o Umlaut alemão) deve acabar. Para isso estão exterminando a fluidez gostosa da língua, as adaptações que o nosso aparelho fonador realiza espontaneamente para tornar o falar mais fácil. Podem ser livres para isso, mas, para quem tem o hábito de observar a pronúncia tradicional da língua, soa irritante e pedante.

Usa “Senhor” em interlocuções que exigem respeito mais acentuado e menos intimidade.

Usa “Vós” apenas para reproduzir linguagem literária antiga em situações de extremo respeito, como no tratamento de deuses e basileus.

Muitos textos desse livro se expressam com citações em português arcaico e uma das características do português arcaico é justamente a falta de padronização. Muitas vezes se vê no mesmo parágrafo uma palavra escrita de dois modos diferentes. Por exemplo mirra e myrrha. Que ninguém se melindre por isso, por favor. Essas formas arcaicas são cheias da vida dos nossos antepassados e do nosso próprio passado. Não devemos extingui-las. Junto com elas seria extinta parte de nossa história.

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