Médéia*

Como deixaste a casa de teu pai, bárbara, louca,

Nos remansos do Ponto,

Nos verdores da Táuride,

Correndo atrás de um homem,

Seduzida, arrastada pela beleza e pelas palavras doces?

Insensata, deixaste cair sobre teus olhos o véu da ilusão

E em teu coração o desejo lascivo que Afrodite, a deusa cortesã,

Despeja sobre as belas virgens que inveja e receia.

Em um navio aventureiro partiste para sempre.

Teus filtros, com os quais quase te igualaras à perigosa Cípria,

Que fazem o amor surgir pérfido e sorridente,

Que fazem a morte medonha assustar

Os transitórios caprichos e ilusões,

Foram infrutíferos e baldados para ti.

Foste arrastada,

Melhor, te deixaste arrastar por um amor leviano, perjuro,

O mesmo amor que humilhou, descartou

E deixou Ariadne desprezada na areia branca da praia.

Que deixa qualquer flor radiante,

Colhida com festas e benevolentes lisuras, encômios e aleivosias

Encolhida num monturo de beira de estrada,

Descartada, ultrajada, como tu, agora, louca,

Acabas com as inocentes dádivas de teu ventre e terminas tua vida.

Que fado infeliz, sozinha, desprezada, numa terra estrangeira e hostil,

Por causa de um homem vulgar e miserável.

 

*Assim mesmo, Médéia, sem observar os novos acordos ortográficos de acentuação, caso contrário o pessoal de São Paulo vai ler Mêdêia, visto que ultimamente eles estão empreendendo uma razia contra o som aberto das vogais “e” e “o” na língua portuguesa. Um dia desses ouvi um paulista chamando o rio Tejo de “Têjo” e frequentemente ouvimos eles chamarem o velho “córação” de “côração”. E isso é novidade, não foi sempre assim. A que se deve essa mudança? 

 

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