O Taxista de Belo Horizonte

Na minha última vez em Belo Horizonte,

Falaram-me de um famoso pão de queijo na Praça da Liberdade.

Procurei um táxi para ir até lá.

Encontrei então aquele velho taxista. Estava parado no ponto.

Creio que na rua Rio de Janeiro ou São Paulo, próximo à Praça Sete.

Sua voz era débil pela idade e quase indecifrável,

Seu corpo também já era débil e frágil. Partimos.

Perguntei se já dirigia há muito tempo na praça da cidade

Respondeu que era condutor há meio século.

Naqueles tempos, quando iniciara, a profissão era boa, dava pra viver bem,

Agora estava ruim. Os policiais dominavam a rede Uber

E combinavam de parar e multar os taxistas para persegui-los.

Já não tinham paz no trabalho. O trânsito também mudara,

Ficara violento. Os motoristas não possuíam mais aquela elegância de outrora.

Nascera em Sabinópolis, na roça. Trabalhava com o pai.

Um dia sentiu que a roça não era para ele e foi para Guanhães.

Tinha quatorze anos. Arrumou um emprego e morou com uns parentes.

Mas lá também não deu certo.

Alguém passou pela cidade e o levou ao Paraná.

Lá viveu uns dois ou três anos.

O trabalho ali novamente era duro. Quis voltar para Minas.

No caminho passou um ano na cidade de São Paulo, mas não simpatizou com o lugar.

Voltou a Minas. Tornou-se chofer em Belo Horizonte.

Não se casara. Tinha gostado de uma moça fina,

Porém sofrera grande desgosto.

Enquanto falava ininterruptamente e com grande empolgação

Chegamos à Praça da Liberdade, pela Rua Sergipe.  Mas ele não percebeu.

Eu disse: passamos do retorno da Praça, estamos indo para a Savassi.

Temos de voltar.

Ele ficou vexado. Era um erro imperdoável. Pediu desculpas.

Eu disse que não tinha importância. Voltamos.

Ele parou no local apontado por mim.

Desci. Permaneci parado olhando enquanto se afastava.

Queria ter compreendido melhor o que falava.

Perdi muitos detalhes da sua narrativa.

Não pude decifrar, no meio do barulho do trânsito, das buzinas, dos gritos

Tudo o que me dizia aquela voz instável e delicada,

Que contava, cheia de emoção e nuances afetivas,

Arrancando de sua afetuosa e estremecida memória,

Fatos significativos, lembranças alegres e lembranças tristes,

Que embora agora já tão distantes, continuavam importantes,

Pois compunham a história de sua vida.

Ele tinha ânsia de contar, talvez intuía um provável fim próximo,

Um epílogo de extrema aridez e silêncio completo

Que emudeceria para sempre todos os tesouros de suas recordações,

Guardados ali na íntima solidão,

Os sucessos e derrotas, as experiências e emoções mais amadas.

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