Eles vivem em conspirações de alcova, com punhais,
Degolas, assassinatos nobres, sangue escorrendo pelos paços,
Combinações e disputas contínuas de linhagem com Castela e França.
Nós trabalhamos, sobrevivemos, suamos,
Sustentamos o luxo dos arcebispos, dos ilustres e dos nobres,
Enfrentamos a fome, a peste, a seca,
Choramos cada morte, cada humilhação, às escondidas,
Nós somos Portugal.
Nós fomos ao Brasil, ficamos por lá, morremos por lá,
Choramos de saudades por lá, sem jamais conseguir voltar.
Morremos também em África, nas Índias,
No mais longínquo Oriente.
Não estamos nas iluminuras dos tomos de história,
Tampouco nos jazentes das Sés nem nos ricos mosteiros
Sobre preciosos veludos, púrpuras e lençóis finos e bordados,
Mas ficamos esquecidos nas areias quentes de uma praia remota,
Nos fundos dos mares, nos abismos das minas,
Nos buracos onde nos jogaram sem nenhuma salvação,
Ou onde nós mesmos caímos, procurando as riquezas em além-mar,
Para prover a família, o velho pai, a velha mãe
Que em lágrimas ficaram,
Na saudade, a olhar as serras, a vigiar o mar,
Em busca de um vestígio, um auspício qualquer, uma esperança,
Até o último momento,
Sem desânimo até o instante final,
Nós somos Portugal.
O Livro Português - The Portuguese Book
Olvidados II
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